story:tell:her

30.12.06

27.12.06

noves fora, tudo


Desde 1997, muita vida junta e uma arro(m)ba de filha.

25.12.06

Star system


A miúda divertiu-se à brava e isso é importante.
Feliz Natal.

Not-so-gingerbread-instead-bolachatorrada-house

20.12.06

Caged


Fomos. Três amigas, duas a duas, dançaram a noite de sábado.
Da aventura, ainda guardo sono e a memória da gaiola. Contei a toda a gente e, por isso mesmo, reflecti-me sobre o vôo. Não é a noite que não é como dantes, sou eu que não sou antes. E ser depois é ser assim mesmo, é temer que haja febre, pesar as horas de sono, é ter a porta aberta e não entrar na gaiola. Ou sair dela.
Obrigada querida, por também não teres vergonha de perguntar onde é o bengaleiro, de ser instruída sobre os euros destacáveis, por dares instruções precisas ao taxista. De noite, sempre foste a minha Sininho.

14.12.06

Cranalogia

Tenho a certeza que me destronará, é uma líder. Não o temo e não é por isso que a quero comer. É mesmo por gula. Uma gula voraz, forte, sentida. Uma vontade física de a engolir. Às vezes contento-me com umas mordiscadelas, uns beliscões ternos, uma massagem. Outras vezes só me satisfazia se a devorasse. Se tivesse uma língua grande, de leoa, também a lambia.
Já tenho recuo que me permite apreciar a evolução do petisco. Começou leve como claras, um soufflé de filha com cheiro lácteo. Encorpou-se numa carne tenra, macia, suculenta da gordurinha de bebé. De dia para dia afirma-se, esguia, ágil, fresca. Ainda me restam umas bochechas e compenso-me com abraços apertados e aquele quentinho de cama que lhe roubo sem culpa. Temo ao pensar que qualquer dia me imporá dieta.

11.12.06

Technicolor



Não sei bem quando remisturei a paleta, mas aconteceu. Depois de muita coolness, reapetece-me colorir a vidinha e o guarda-roupa, recuperar a largura do espectro. Fiquei até às tantas a tricotar um arco-íris excessivo, dois novelos diferentes e mesclados, e a ver o Scaramouche. Contentinha, visto-a ainda mais recombinada do que o costume. Tenho cá para mim que tanta coloroterapia lhe estimula a rabinice. Hoje foi de rosa e vermelho. Eu estou de verde, rosa e lilás. Mas mesmo lindo era servir arroz azul no Natal.

Christmas Three


Fizemos a árvore, pela primeira vez com a ajuda dela.

9.12.06

Lady Kluck


A tempo da festividade e a contratempo das tarefas em falta, é o avatar do momento.
Knitty Winter 2006.

5.12.06

scarfberry

necessaire



É verdade que nunca cheguei a dormir de botas, mas palavra que gosto de aconchegar os presentes e partilhar-lhes os sonhos. Deve ser por isso que sempre me entusiasmaram as histórias de brinquedos traquinas e aventuras nocturnas. Deve ser por isso que a minha cabeceira de Natal é um tesouro de quentinhos.
Ontem ofereci-me um presente lindo, tão lindo que ainda estou aos pulinhos. Como já sou crescida, não embrulhei e esperei três semanas, antes passei o serão a contemplá-lo enquanto espreitava as aventuras impossíveis do Ethan.
Hoje apetecia-me ficar na casinha dela a compor as necessidades do meu tricô. Queria fazer o meu arquivo de padrões e instruções, arrumar as agulhas e as gramas de projectos. Queria brincar assim * * *.

4.12.06

...

Ao fim do terceiro dia confesso que já anseio pela ressurreição no meu gabinete. Hoje de manhã até fui capaz de atacar o relatório financeiro e fazer um excelzinho para perceber que não gastei 2748.17 euros públicos que vou doar ao orçamento de Estado como sinal de boa vontade.
Aliás, duas mil setecentas e quarenta e oito vezes deve ser o número aproximado de vezes que a minha filha chamou por mim desde a restauração. Mais dezassete sussurros ou chamadas sonhadas.
O legislador é um homem de família e percebeu que seria impossível gozar mais dias de férias e manter a sanidade da população activa. Isso e cozinhar mais almoços e jantares seguidos. Se cheiro mais um refogado desmaio. Hoje comemos gelatina, que faz bem às unhas.

28.11.06

And a bang on the ear

Bem a jeito para a efeméride, ontem bati com a cabeça na parede. Em frente de todos, com a cataplana ao lume, acertei com força, com muita força, numa ombreira. Ouvi o estrondo a ecoar-me por dentro, fechei os olhos e anunciei-lhes a preocupação com o lume. A seguir, encostei o frappé à pancada e continuei.
Ainda estou tonta. Três anos de rodopio e uma ombreira concorrem para me vacilar. Ela estava feliz, mimada, eufórica com a casinha e a atenção. Recusou o vestido de fada e fui eu que usei o colar. Não faz mal, o bolo da escola tinha smarties e eu em casa consegui salvar o edifício de cenoura do Jamie com o maravilhoso topping de mascarpone e lima. Eu é que sou uma fada e bem que usei o meu uniforme. Isso e os músculos da mão direita.
Não sei bem porque o faço. Porque insisto numa ementa própria, absorvente, que me serve já turva aos da casa. Ela certamente não me saboreia melhor do que a uma caixa de miniaturas e nem sempre posso vestir a Cinderela entre dois palitos no forno, mas de algum modo lhe ofereço o que tenho. Espio-me de ralhos e sobrolhos numa mamã de avental, num bolo torto, recuperado com uma espátula e a vontade de ser capaz. Enformo-me em biscoitos de chocolate, dou-me temperada de sal e mel, tostada de amor. É por isso que o faço, para me oferecer num altar com base de cortiça.

27.11.06

***

Mamã, três anos.

***

Mariana, 3 anos.

22.11.06

Arrivals

Hoje fui à minha escola velha ouvir o meu chefe novo falar coisas novas sobre assuntos velhos, podemos mesmo dizer mortos, embora não menos vivos por isso.
Percebi que eu já fui mais à frente do que sou hoje, que a memória é algo que se aprecia melhor quando já se tem alguma. Eu escolhia sempre o futuro: a ciência que o inventa, o jornalismo que o procura, a novidade, a trend. Hoje valorizo o presente, entusiasma-me a gestão (?!), a mudança contemporânea. Qualquer dia ainda gosto de antas e cromeleques.
Discordo da expressão "X não era do seu tempo". Para além da óbvia impossibilidade física, aborrece-me a injustiça. É exactamente por estas pessoas serem e viverem plenamente o seu tempo que esse tempo evoluiu para outro. Que o mundo gira e avança e isso, que eu também aprendi as frases do senhor.
Depois há a nostalgia. Aquele nevoeiro emocional que nos aporta ao saudosismo, ao "no meu tempo", em que provavelmente nada era consideravelmente melhor ou pior, mas em que o tempo era nosso, porque parece que o tempo é sempre dos jovens, que o agarram com mais força. Nestas plateias geriátricas, cheias de memórias e tempos que não são meus, percebo claramente que o meu tempo é agora. Uma coisa extraordinária no meu chefe é que dá-me sempre vontade de ir a correr trabalhar.

____
Esta URL hoje esteve por uma tecla. Mas como senti o encosto suave da memória vou dar mais uns bytes ao seu futuro. Isso, recebi uma generosa oferta de template (que ainda não é este, estou só a experimentar) e lembrei-me que posso retirar os comentários.

20.11.06

Departures

Hoje continuo um bocado arreliada de tudo e até já tomei um comprimido que me aliviou o almoço. Parece que quanto mais me doem os dentes mais a fome me aflige, deve ser psicossomático. Tenho o lábio pleno de vesículas virais numa lástima de contágio e esqueci-me da pomada. De manhã esqueço-me sempre de parte do meu dia que ninguém consegue por na rua tanta tarefa antes das oito. Ela hoje lavou as "ramélias" e os dentes, pelo que não veio o Zovirax. Continuamos a ter "mélguias" lá em casa, o que proporciona mais um unguento e uma necessidade de o aplicar topicamente. Sempre gostei da expressão aplicação tópica.
Amanhã vou fazer uma expressão tópica (assim levezinha e não sistémica) ali para o pé do aeroporto. Convidaram-me para falar sobre coisas de que já falei outras vezes e agora é que me deu para a apreensão. Temo que os sisos não me deixem acabar as frases ou esquecer-me do entusiasmo. A miúda amanhã pode ir com ramélias, agora eu não posso ir assim sisuda.

19.11.06

O doutor já me tinha avisado, vai para uns dez anos. É que eu já conheço o doutor há mais de vinte e cinco, quando me apertava parafusos no céu da boca. Acontece que tenho os sisos mal parados e agora doem-me até às orelhas. Estou tão habituada a incómodos de boca que já só ligo quando os pequenos guinchos dela me parecem intoleráveis e a comida feita de cimento.
Claro que não tenciono fazer nada por enquanto e aproveitei que a miúda e mais os seus guinchos foram caridosamente recolhidos pelos avós para pintar o cabelo. Cheguei lá a pedir uma misericórdia parda, um banho de qualquer coisa, mas não escapei dos pacotinhos de alumínio que guardam mechas molhengadas de caril como se fossem tesouros. E foi naquele preparo de descabelada biónica que foi preciso mudar de cadeira, atravessando a zona pública, onde qualquer incauto que se abastecesse de víveres no Carrefour me pôde apreciar as melenas.
Agora tenho o cabelo mais claro, assim um bocado mais canelado do que a minha estética preferia, e obviamente reencaracolado, mesmo depois dos puxões corajosos da Ana Maria. Mas se eu conseguisse exprimir-me cabalmente nos cabeleireiros tinha era pedido chocolate de leite, como o dela, se há coisa mais linda...

17.11.06

"There is no prize for the second"

Ontem tive uma boa ideia. Até que enfim. Esta semana era das ideias, das pausas. Vagares que antecipam acções, movimentos. Que justificam as horas que desfio sozinha, comigo, com o motor.
Não consigo laborar em contínuo, num gráfico de actividade constante. Se fosse uma linha era uma sinusóide. Resfolego em cima, suspiro em baixo, aceito-me. Não acredito em cristas permanentes e desprezo a rasteirice.
A ideia de ontem pareceu-me tão boa que lhe concedi um caderninho novo.
Nunca escrevo na primeira página, na primeira linha. Resguardo-me com um desfolho e um cabeço de linhas. Escrevo a preto. Há anos que escrevo a preto. Preto no papel macio, casca de ovo. Este template devia ser assim, mas eu lá sei mudar tantos cotovelinhos.
A minha ideia se calhar é uma porcaria sem ponta nem trajecto, mas ontem cumpriu-me e isso já vale alguma coisa. Isso e ter-me tropeçado no meu primeiro grande chefe, a quem devo a escola e o desassombro das escolhas.
Many, many thanks.

15.11.06

Post 910

Escrevo por títulos, por palavras-chave. Visto-me por tema, cozinho por género. Escolho os filmes pelos actores e as músicas do costume. Há anos que os amigos são quase todos os mesmos, ou novos parecidos com eles. Esquerdalha de nascença, sou afinal uma conservadora.
Ele gosta de ir aos mesmos sítios e eu gosto dele. Chegamos a repetir escolhas em momentos breves e locais desconhecidos, a forçar uma regularidade de dois dias. Gosto da minha vila porque não é uma cidade, eu que sou viciada na cidade.
Derivo. Muito facilmente derivo, já tive três profissões. Não sei o que escrever nos formulários, o que ensinar à miúda para dizer na escola.
O que faz a tua mamã?
A mamã escreve títulos.

Começo um relatório pelo índice, faço óptimos índices. Nunca decorei o título da tese porque não era um título, mas uma condescendência amanuense. Devia ter-lhe chamado "Uma aventura nas terras azuis" ou "Poison ivy". A tese mais linda que já vi era a da minha amiga.
Dá-me um trabalhão criar eventos na vidinha. Os acontecimentos orientam-me os dias, as disposições. Tenho semanas ancoradas em epifenómenos. Custa-me rolar a agenda numa velocidade constante. Trabalho muito e não trabalho nada. Tenho uma vontade fugidia, mimada. Preciso desesperadamente de marcos, compromissos com dia e hora. Se fosse um objecto era uma agenda e daria uma boa secretária. Assim sendo navego no calendário, marcando-me sem muita convicção.
15 de Novembro, 10:15, escrever post inconsequente.

13.11.06

Baby pink



Olhando-me, aqui no blog por exemplo, diria que sou uma mamã entre o fucshia e o lilás.
A coisa não é fácil e não é como mais nenhuma outra coisa difícil. Eu não sabia ao que ia, acho que ninguém sabe. É impossível imaginá-los e a nós e ao mundo connosco. Tem tanto de extraordinário como de aterrador. Lembro-me de um jantar, no Kalpna, onde a mulher do meu chefe, mãe de três, nos confessava, e a si própria, que os momentos mais maravilhosos e os mais devastadores lhe tinham chegado com os filhos, pelos filhos. Entre os vários serões que partilhámos (incluindo as narrativas das tentativas de depilação - dele) este é o momento que mais me ocorre. Talvez competindo com a vez em que agradeceu alegremente a garrafa de Porto privado de 1947, enquanto a limpava com um esfregão (sujinho, hem?) e vertia estrondosamente em copos de whisky.
Claro que a culpa não é dos putos, é nossa. A minha é mesmo muito minha. Muito mais minha do que de qualquer outra entidade singular ou colectiva. E o mais irritante de tudo é esta certeza de que contribuo para a propagação do equívoco, que o inflatuo e transporto, que quase o acarinho. Mil vezes estúpida. Hipoteco o humor com frustrações de cotão, (des)oportunidades pedagógicas e jantares insonsos. Culpo-me por todos os lados menos por um que é o istmo. Peninsulo-me, às vezes muito estreitinha, quase a derivar. Quero ser confiante, calma, segura, competente, alegre, sexy, divertida, inteligente e já agora ter o cabelo liso. Sou muitas vezes hesitante, instável, furiosa, desligada, olheirenta e, definitivamente, encaracolada. E isso é que é normal. Os superpoderes de almanaque trazem aos heróis uma profunda solidão.

[via mothern, para ler na Época]

11.11.06

Pais II


E passamos a usar o coração fora do corpo.

Pais I


Os filhos mudam-nos o centro de massa.

10.11.06

Preciso de uma mola nova para o cabelo. Não sei da minha mola castanha e agora estou inquieta. Uma boa mola é difícil de encontrar. Tem que ter um bom tom, dentes macios e um formato médio, nem grande, nem inútil.
Uma boa mola de cabelo é um objecto íntimo. Acompanha-nos nos momentos de maior trabalho, stress, calor. Perde-se na mala, mas está sempre lá (onde estás, mola?). Não pode ter ar de cabeleireiro, tem que ser elegante, embora também se use para lavar a cara. Vai às reuniões e faz o jantar. É hierarquicamente superior aos elásticos. Procuro-a.
Se há coisa que prejudica um filho único, é não aprender a dividir sobremesas. Eu nunca vivi o "um parte e o outro escolhe". O resultado é ser incapaz de discutir por comida e sequer assegurar uma quantidade decente de sobremesa quando partilho maritalmente uma fatia de açúcar. Agora chegou a ajuda.

5.11.06

Our way



Querida Mariana,
Estás quase a fazer três anos e vais ter o teu primeiro vestido de fada. Serás uma fada dos bosques, verde e lilás. Ainda não arranjei foi sapatos capazes para dares pulinhos de alegria encantados.
Estás tão pesada que já não consigo fingir que és bebé. Desequilibro-me nos colos e até já te acertei com a cabeça na porta do carro. É verdade que sabes subir sozinha para a cadeira, mas gosto de proteger-te da chuva no chão, do trânsito do lado.
Insisto no carrinho para os caminhos compridos ou populosos, mas já negoceio contigo os cintos e as descidas.
Falas tanto e dizes coisas tão engraçadas. Hesito entre corrigir-te a gramática ou deliciar-me com as irregularidades. Eu não sabo. Eu trazi. Mais grande.
Continua a apetecer-me engolir-te. Guardar-te como os tesouros. Já sabes que estavas na barriga da mãe. Que eras pequenina. Muito pequenina. Juntas as mãos num tamanho minúsculo, a explicar-me quão pequenina. Engulo-te.
De manhã vou buscar-te e aperto-te no quentinho. Nunca me apetece sair dali, mas eventualmente tu lembras-te dos livros ou eu fico responsável. Às vezes grito contigo de manhã. Que coisa horrorosa.
Gosto mais de ti do que de pão com manteiga.

Take 2

Tive o meu primeiro email em 1995. O programa era muito simples e corria em Unix. Eram os tempos do Mosaic e das primeiras conversas em tempo real por Telnet. Apaixonei-me por email, mas nunca gostei das conversas de monitor. Nesses tempos quem andava na rede era a malta das Universidades, em especial os estudantes de ciências. Um dia recebi um email dum tipo do Técnico, a meter conversa. Nessa altura eram comuns as famílias virtuais entre os miúdos que passavam (des)horas on-line. A minha resposta foi get a life (antipaticazinha, hum?). Parece que agora é mesmo possível conseguir uma.
Hoje o jornal explica-nos tudo.

30.10.06

1990-2006


Dezasseis anos é quase uma maioridade. É tempo que chega para passarmos uma tarde a rir através dos miúdos que pulam a alegria num colchão que nunca voltará a ser o mesmo.
Deve estar a fazer anos que nos encontrámos na mesma lista de aprendizes e desfilámos nas palmeiras do Jardim. Que entornámos risos nas bancadas tortas, finalmente protegidas de nós, uns putos, estudantes de tudo o que - palavra de honra - já não me lembro.
Mas lembro-me das borrachas das destilações a esguichar enquanto gargalhávamos, de ti com uma mão cheia de dedos entubados, cinco filtros em estrela e um ralhete colectivo da Assistente. Naquela altura ainda havia Assistentes para quem escrevíamos relatórios reinventados e passados a limpo num 286. Sou um fóssil de miúda, maravilhosamente renascida.

27.10.06

1993-2006

Parece que foi há 13 anos. Lembro-me de estarmos cá fora, no Parque, antes de entrar. Foi um concerto fantástico. Um triplo encore que quase nos levou às lágrimas. Desta vez temo a fartura de performances. É verdade que se assim não fosse nem ia, que me distraí e, não fosse a Ana, já não o conseguia ir ver de esguelha (visibilidade reduzida...temos que ir cedo). Também parece que não há best of.
Continuo um bocado mal-humorada e ainda faltam 10 dias.

24.10.06

É uma pena estar a chover tanto. Preciso de sair. Lembro-me da Britlândia. Tenho saudades de lá e de não ter medo da chuva. Cá sou mais hidrofoba, comodista, limitada. Também estou mais seca.
Aposto que lá encontrava em stock os livros que namoro e a revista do cachecol. Não gosto nada de encomendas. Lembro-me de ser miúda e odiar as provas da roupa. What you see is what you get. Lá vive o meu blog favorito do momento. Este fim-de-semana dobei uma meada pérola.

23.10.06

Grounded

Estou térrea, fundeada, um bocado afundada. Não tenho leveza para imaginar, tomara já realizar a vidinha sem mais. Ontem ensopámos a cozinha com a chuva do quintal e a moral com o pior naufrágio de champô Johnson da história familiar. Seis pernas e seis braços desordenados, angulosos, perdidos de fúria. Tudo por uma espuma escorregada. O castigo vai durar, que não posso perdoar-nos assim tamanha ondulação.

Como não tenho previsão, não consigo começar o cachecol. Escolhi as cores, ou a sua ausência - branco, preto, ratinho - mas não tenho ponto, ponta. É pena, que me apetecia ocupar o desconsolo.

Ao menos ela tem o cabelo liso, o que é bom. Diminui a tensão filial e sempre evita que se vá sentir ainda mais desconchavada nos dias de chuva. Upa.

22.10.06

Difficult like sunday evening


Não consigo as instruções para fazer este cachecol, mas lá consegui aprender a entrelaçar o fim-de-semana. Agora apetecia-me outro para praticar. Isso, esquecer-me da pior birra sequer imaginada e saber fazer luvas.

19.10.06

Does God play dice?


Enquanto eu espreitava o passado da rua no preto e branco do glamour emoldurado, entortava-se a linha A, onde a vi direita meia hora antes. Ainda não consigo deixar de pensar nisso.

Veni Vidi

13.10.06

Nostra Vita


è Dolce.

10.10.06

N.T.



Chegou-me ontem, por registo, enquanto fazia o jantar. Recebo tantos volumes daqueles que não sei porque o senti diferente. Cortei o cordel com a tesoura do peixe e, ainda que saturada de caril, farejei-lhe a história.
Revi-me redonda, quente, dupla, na espiral que segurava as anglofolhas,

The pleasure of finding things out

Diz-se que era machista, arrogante, quase insuportável. Que era divertido. Brilhante.
Tive-o comigo tanto tempo e só o conheci no fim do prazo, como faço sempre. Traduzi-lhe a conversa e nunca mais pensei nisso. Esqueci-me daquela descoberta, entretida que estava com a outra.

P.S. Claro que não posso abrir mais do que as páginas de títulos, assim como não se pode reabrir as teses. Antecipo nervosamente os erros que não sei se estão lá e sofro com as críticas de que nunca vou ter conhecimento.

MariUna


Muitas das mamãs de 2003 estão quase a ser mamãs de 2006.
Relembro histórias de barriga e de berço, percebo que já passou tanto tempo, que já me esqueci de tantos pormaiores. Já não tenho um bebé, uma filha pequenina. Vou sempre ter uma filha pequenina, será sempre a minha menina, o meu bebé. Não sei quanto pesa na balança, mas sei o quanto me pesa nos braços, no colo, nas costas, no coração. Nunca gostei tanto dela como agora, nunca a gozei como agora.
Lamento-lhe a indivisa condição de filha, mas não prevejo mais do que o nosso esforço para que na sua singularidade seja equilibrada e feliz.

AzeitAna



É tão lindo, o meu fruto.

Spoonful


Eu, que gosto muito de cozinhar, nunca sigo a (p)receita. Este meu lado fora-da-lei aprecia particularmente as prescrições de medidas duvidosas, dependentes da crockery* familiar. A verdade é que cada família vive as colheradas que tem e com elas rasa ou enche o sabor da sua vida.
As colheres da minha casa são normais. De inox, com um desenho comum, sem cabos decorados nem volúpias de modernidade. São colheres práticas, pragmáticas, fiéis. Servem-nos há anos e, já tendo avaliado outras, não as retirei da boca.
Quando meias, faço um esforço por vê-las cheias. Porque estão de facto cheias e esta minha inquietude pode facilmente entorná-las. É tão fácil entornar as colheres.

*palavra favorita

8.10.06

then remains of the night


Ontem jantámos no quintal, com velas, porque 1) somos miúdas de gosto e 2) não temos lá candeeiros.

Wish upon a star

6.10.06

Crocodile Dandy


Enquanto perseguia umas sabrinas cor-de-rosa, encontrei-me com o futuro dos meus pés. Não fosse eu ter começado a investir no look lady e trazia as amarelas para usar no trabalho. Até cheguei a ter saudades do tempo em que vivia de bata e mãos enfarinhadas de látex.

1.10.06

'Tou nem aí



Pediram-me um CV para justificar um convite para ir ao Brasil dizer umas coisas a umas pessoas numa sala de conferência. Neste momento, não é possível emitir um tal certificado das minhas eventuais capacidades sem a seguinte adenda:

Qualificações
Absolutamente nenhumas, depois de considerável perda de massa cerebral em vida.

Actividades académicas
Submissão compulsiva de candidaturas perigosamente perto do fim do prazo legal depois de sofrimento excruciante por falta de informação relevante e percepção do real problema das universidades: os universitários (eu incluída).

Actuais interesses de investigação
O papel das leggings na composição do look urbano Outono-Inverno 2006/2007.

Foi pena nunca ter ido ao Brasil.

Peixe (detalhe), Mariana 2006.

21.9.06

Violent Femme

Tenho 34 anos.

I'm high as a kite

Assim de novo, novo, parece-me que tenho o eixo do nariz torto.
Deve ser de tanto o torcer a tanta coisa.
Torto para a direita, o que conceptualmente acho mal.
Deve ser da idade.
De manhã, no trânsito, ouvi-me como há anos, há montes de anos.

Let me go on like I blister in the sun

19.9.06

Up-grades


Segunda noite na caminha de menina.
Na primeira caíu de sono. Ontem fizémos nós uma barra de protecção, que as das lojas não funcionavam.

15.9.06

Os Des'Animados*

Parece-me que são cada vez mais. Por todo o (meu) lado, pelas mesmas ou por outras razões. Das lágrimas aos suspiros, das conversas analisadas aos comprimidinhos para rir, algo vai mal no país dos brinquedos. Reparo que não há médico na cidade do Noddy. Há mecânico e polícia, mas não há médico.

*ou como ela me pede para ver televisão.

11.9.06

11...9...5

Eu, que trabalho por baixo de um corredor aéreo, hoje não tenho descanso.
A cada ronco desconcentro-me e matuto, e se fosse comigo, e o que é que eu fazia, e o que dizia, e a minha filha, a minha filha, a minha filha, a minha filha, a minha filha...

7.9.06

Menina da página 27



Este post não é um pedido de consolo, é um serviço público para quem encomendou a mesma referência do catálogo de 2003.

A minha filha Mariana:
> faz birras
> atira coisas para o chão quando está zangada
> às vezes levanta a mão
> eu às vezes levanto a mão
> ocasionalmente há mãos que descem no sítio errado
> consegue passar longos períodos em silêncio, imóvel, por vezes no escuro ou atrás de uma porta, sem chorar, a manter uma posição de desafio, de castigo, sem nunca chegar a pedir desculpa, mesmo que eu às vezes faça parecer que sim
> consegue gritar tão alto que nos tilinta o cerebelo
> reage quase sempre com um safanão a tentativas de contacto pela parte de estranhos
> finca as unhas nos meus braços e franze o nariz, a fazer de má
> quase todos os dias faz fita para se vestir
> enquanto esbraceja e dá pontapés e se enrola
> às vezes até eu começar aos gritos
> é que eu grito
> não deixa cortar as unhas sem fitas e negociações e, às vezes, gritos
> detesta lavar a cabeça
> muitas vezes não quer dar a mão na rua
> não fica ao meu lado em sítios públicos
> chegando mesmo a correr, se possível em todas as direcções
> fala por cima de nós, quando nos distraimos a conversar sem ser sobre ela
> o que me dana à brava
> mas mesmo à brava
> ainda faz fitas na escola; para ficar e para se vir embora.

E, no entanto, não a consigo imaginar mais linda, mais perfeita, melhor.

6.9.06

Note to self

Acabou-se o biberão.
Quase que acabou a chucha fora da cama.
Vou comprar a barra de protecção para a passar para a cama grande.
No outro dia disse "não posso acreditar...".
Embirra com vestidos e pede antes uma "roupa" (T-shirt e calções).
Ensaio novos modos de ir às compras sem carrinho, mas nada resulta muito bem.
Passou a pedir a luz acesa para adormecer e fala em "medos", "maus" e "monstros".
Eu fico lá mais tempo a fazer miminhos e a abanar o cabelo transpirado com o livro do Heffalump.
Gosta de sapatos. Gosta muito de sapatos.
Já tenho calças e polares, faltam T-shirts de manga comprida e sapatos.
A girafa é o bicho do momento.
Come os flocos sozinha e quase não entorna.
Não desenha nada com forma distinta. Risca com força e faz os círculos counter-clockwise.
Ela é o bebé-tigre e eu sou a mamã-tigre. Ou gatinho, ou peixinho, ou o que for.
Já não gosta de ervilhas.
É um castigo dar-lhe fruta.
Não se cala.

31.8.06

Listen carefully, I should post this only once

Ontem quase perdemos a 24. Imperdoável. Arquejo a semana inteira pela quarta-feira e depois falha-me. Ainda resgatámos o Jack a 2/3 da aventura.
Hoje lembrei-me do Jason, que foi meu colega lá nas terras altas. O Jason um dia, por entre as pilhas de jornais que acumulava no seu canto de bancada - que a segurança do edifício já tinha ameaçado como sendo um fire hazard - contou-me que estava em testes para os inteligentes britânicos. Também me avisou que era possível que viessem falar comigo, que partilhava desoras com ele no laboratório. Parece que escrutinam a vidinha dos seus aprendizes e poderiam vir perguntar-me coisas sobre ele. Que excitação.
O Jason era um rapaz alto, inteligente e preguiçoso. Muito inteligente e muito preguiçoso. O viva dele ficou histórico no instituto, pelo número de horas que reteve os examinadores nas alcatifas puídas do antigo Daniel Rutherford Bd. Eu li a tese e sei porquê. Estava falha de resultados, mas plena de teorias. O rapaz era muito criativo.
Outra das glórias da comunidade era o nosso Jack, o JHH. Dizia-se que durante a Guerra foi chamado a Bletchey Park com o argumento de que um biólogo treinava a visão de sistema e era um bom esforçado de guerra no pensamento complexo. Eu não tenho dúvidas que tenho um pensamento complexo. A maior parte das vezes é mesmo complicadinho. Eu sou complicadinha. Uma vez até enviei um currículo. Nunca me chamaram.

30.8.06

Lacraus

Eu lacro
Tu lacras
Ele lacra
Nós lacramos
Vós lacrais
Eles lacram

28.8.06

Bifidus de morango

Estou viciada em vestidos de malha pretos, pretos e brancos, cinzentos ou afins. Parece que os encontro por todo o lado, elegantes, discretos, fantásticos. Muito lady-like. Claro que no cair dos vestidos de malha há que manter os movimentos da tigela absolutamente controlados, sob risco de insuflo de estilo.
Estou a poucos dias de uma deadline importante e, portanto, aborrecida de morte. O sistema informático colapsa a cada mudança de campo. Entre logins, para espairecer de tanto requisito, sonho com uns sapatos vermelhos.

22.8.06

B(l)ack in town

Este ano regressámos mais cedo. Não costumo habitar o Agosto na cidade. Nem eu, nem ninguém mais no meu trabalho. Vou ter que resgatar um café a 10 minutos de passo estugado.
A menina voltou para a escola contente, sem choro. Ontem nem se queria vir embora, a rebolar, imunda, por cima dos pinhões que caíam no pátio. Estão cá os pequeninos quase todos. Sabe, os mais velhos ficam com a família, estes ainda dão muito trabalho. Têm o dia todo para brincar. Ontem trouxe-lhe uma varinha mágica e uma coroa de princesa. A realeza não lhe assenta, mas a magia está a ficar apurada. Inventou a sua primeira letra de música: Saí do castigo, já não me porto mal, nã, nã, nã.
Eu tenho mais um vestido preto e uns ganchos de leopardo. Por estrear.

21.8.06






Prejudice

Puseram-no na montra e isso é que me deixou zangada. Há quatro anos enterrado no veludo, esquecido deles mas não de mim, e agora é que se lembraram de o mostrar. Vi-o por acaso, no caminho do supermercado. Trazia um polar verde tamanho 5 anos, calças de algodão para a escola, dois pijamas com riscas verdes e duas cuecas pretas.
Uma memória de cinco pedras, brilhantes, clássicas. Não uso anéis de pechisbeque.

Tive uma colega na Escócia que em vez de shit dizia sugar. Aliviava-se num shh de substituição e gritava pelo açúcar várias vezes ao dia.
Lá na serra, convenci a minha filha de que o rebuçado que me trouxeram com o café não era mais do que uma lagarta com pêlos. Abandonou a prata. Não me arrependo. A miúda ainda nem tem a dentição completa e alarmam-me os engasgos. Tem a vida toda para açucarar os dias.
A mim às vezes apetece-me um chocolate, mas os cafés de aldeia só têm kitkat. Gosto de chocolate preto, sem amêndoas, nem licores, nem camadas. Chocolate preto simples. E de Casal Garcia. Não me apoquenta a parolice deste gosto e sorrimo-nos com a aplicabilidade do slogan.
Numa tarde de calor, a minha sogra defendia convicta as potencialidades de um copo de vinho ou de um café para enfrentar alguns dos momentos mais estreitos da vidinha. Acenei, convencida, e comprometi-me a espalhar a nova.

Pride



Acho que vou acabar por arrecadar a tradição num vão de escada da capital. Vai uma pessoa ao Minho e não vê um único coração. Ele era só pendentes modernos e anéis pesados. Não gosto muito de ourivesaria moderna. Para isso há o pechisbeque. Adoro pechisbeque, daquele que não é para enganar a fingir de bom, mas do divertido, autêntico. Vou muitas vezes a lojas de bijutaria.

30.7.06

CapitANiA

É um fio de couro preto com um pendente. Um sorriso cravado de brilhantes. Não é fúnebre, é rebelde. Um sorriso de pirata.
Vou passar o verão de calções e olho de vidro.

Mrs Wrong

Pouco depois de lhes fechar a mala, desci à garagem e liguei a ignição.
É igual e diferente do meu.
O volante, as mudanças, a rouquidão. A minha versão é macia e estável. Por outro lado, uma redução no traseiro é sempre uma coisa positiva.
Misturei-me no ar condicionado do shopping e (re)vesti-me de preto chique. Desfolhei infantilidades e madurezas e só não o comprei porque de repente me ocorreu que ficava bem com os calções novos e logo a seguir me horrorizei com tamanha futilidade.
Quando experimentei o colar, percebi que estava pronta e podia seguir em paz.

Mrs Right

Eles foram já ontem. Empacotei três semanas de família, uma caixa de bolinhos e fiquei. Ainda trabalho e vou lá ter de expresso. Esvaziei-me de logística e migalhas, esventrei o frigorífico. Instruí-o de mil pormenores de que ninguém se lembrará. Fiquei de regar o manjericão e dispor dos reciclados.
Hoje dormi mais uma hora e não aspirei folhas de croissant do sofá. Saí para um café e aproveitei o bom dia da vizinha para explicar que eles já foram. Bolas, que fraqueza. Qualquer dia começo a meter conversa nas lojas.

23.7.06

Generation gap

Ia jurar que nos olhou com saudade e uma ponta de inveja. Sentada na sombra, direita, ao lado do jornal que lhe segurava o marido.
Eu bocejava no jardim a manhã que há semanas desejo passar na cama. Àquela hora já eu tinha outras quatro de entertaining e migalhas.
E, no entanto, jurava que lhe senti a saudade.
Nós somos novas e temos filhos pequenos. Andamos mais cansadas que sempre. Limpamos a incontinência, os apetites e as nódoas de todos, servimo-nos sempre no fim. Mas somos novas e temos filhos pequenos, pedacinhos de gente tenra que nos adormece no colo. Os nossos maridos ainda têm dentes e apetite. É verdade que há vezes que lhes amaldiçoamos a gula, mas somos novas e eles também. Reviram-nos os filhos no ar e reviram-nos o ar.
Temos filhos pequenos que correm e se arranham. Que choram lágrimas fáceis, de escorrer e de secar. Querem-nos os beijos e os colos e as atenções. Querem-nos. Todos nos querem agora e isso deve ser uma grande sorte.
A ver se me lembro mais vezes disto.

XX-rated



As miúdas gostam de cores e lacinhos e brilhantes e outras pirosices.
Pelo menos eu gosto e ela também. Ontem passámos o dia a pentear cavalinhos, a fazer trancinhas e a espreitar o espelho mágico. Ele esguelhava-nos com a incompreensão do Y alimentada uma vida inteira a espadas e tractores.

22.7.06

15.7.06

Gross weight

Aproveitei que ele esteve fora para empratar cereais, fruta e iogurte, a ver se desbalanço dois quilos. Está bem, é verdade que também comi os restos da comida dela. A Mariana gosta de grão. A sopa desta semana é de grão. Eu também gosto de grão. E de humus, gosto à brava de humus. Mas cá não se vende humus já feito nos frescos do supermercado, pelo que já não como humus há uns três anos. Uma vez convidaram-nos para jantar e só havia humus e tostas de milho. É bom, mas é pouco, principalmente para seis, dez, que perdi a conta aos convivas. Claro que isto não foi numa casa portuguesa, que a malta tem muitos defeitos, mas alimenta-se. O que não me ajuda a alijar os dois quilos.
Quanto é que pesará o meu cérebro? É que esta semana juro que o senti a esvair, oleoso, transpirado nas dobras das pernas e na raiz do cabelo. Meio quilo de ideias devem ter-se evaporado. Coitadinha da miúda, que esteve tantos dias com uma mãe evaporada. "O pai foi à buedafesta", o que é capaz de ter sido mais ou menos verdade.

Escrevi humus porque por exemplo, mas se calhar devia ser mesmo hummus.
Humus lembrou-me húmus, mas não achei grave.

Net weight

Eu dou-me mal com o calor. Fico tonta e um bocado estúpida.
Não gosto de o sentir por todos os lados, a invadir-me. Não gosto que esteja à minha espera do outro lado da porta. Agora fecho a porta à chave porque ela consegue abri-la. Também não gosto nada disso de nos fechar, mas gostava ainda menos de ir resgatá-la às pedras da calçada.
O calor pega-me as ideias e fico desarticulada, o que não faz parte do conteúdo funcional do meu emprego. Logo nesta semana fartei-me de andar na rua, a derreter as ideias que me dão tanto trabalhinho a solidificar. E a roupa? O que é que uma pessoa veste nestas (des)condições? Não posso estar despida de praia enquanto discuto rubricas de orçamento e chaves de imputação. Um dia destes desejei um cabelo curtíssimo que vi no metro. Tivesse eu ali um cabeleireiro, ou mesmo um barbeiro, e já estava. Isso é que era. Curto daquele curto que se lava e não se seca e não se penteia, que é como se não existisse. Não tivesse eu este nariz e cortava o cabelo.
Sim por não vou orçamentá-lo em outras despesas correntes.

10.7.06

Smoking, no smoking

Já cortei, pintei e, a bem dizer, não se nota nada, pelo que não sei se vale a pena postar.
A cor que não se vê chama-se tabaco e eu devia ter desconfiado. No cabelo fica bem é o chocolate ou a canela.
Quando lá cheguei, a Ana cabeleireira pega-me numa madeixa e diz: Ai que horroroso!
Fitei-a com desalento e disse que não queria nada vistoso, só uns tonzinhos para animar. Não me apetecia enfrentar as bocas de espanto e os comentários de corredor. Eu sei que isto abre, mas agora, de repente, apetecia-me outra vez um sol dourado, sem literatura. Sim, que eu já fui loura. Dava um trabalhão, uma pessoa fica paranóica das raízes, mas quando está bonito é muito mais bonito. E fica muito melhor com o bronzeado. E ele gosta mais.
Buáaaaaaaaaaaaaa.

6.7.06

CondiciAnAntes

Enquanto não cortar o cabelo não postarei.

2.7.06

Just nail it


Vermelho aberto. Como diz a Jane: Frankly, I don't give a damn.

Actually, I'm fed up.

P(Ana)lidades

Eu tenho tosse.
O pai tem ranho.
A miúda tem tosse e ranho.
Eu hoje vim trabalhar para um edifício vazio, alarmado. Aquela gritaria na entrada lateral ainda nos faz sentir mais desalmados, desapropriados, incompetentes que não fomos capazes de acabar o trabalho em tempo oficial. Hoje vim a penalties.
Apetece-me por um fim a isto e ir ver os saldos.
Isso e deixar de lhe limpar ranho verde.

25.6.06

Socorro

Eu não vejo muita televisão.
Eu não gosto muito de ver televisão.
Eu não sabia o que era a 24.
Ontem vi pela primeira vez, por acaso.
Não consegui parar de ver. Durante umas quatro horas.
Deitei-me às 2h30.
Hoje continuou a dar um especial da Season 4.
Aquilo devia ser proibido.
Estamos a gravar.
Não consigo sossegar na mesma.
Quero deixar de trabalhar para ver aquilo. Provavelmente vou deixar de dormir.
Eu não via muita televisão.
Eu preciso de ajuda.

21.6.06

Grupo PAA

Ocorreu-me que devíamos marcar uma viagem. Só as três. Assim uns dias de folga, de fuga. Uns dias de miúdas, de risos parvos misturados com lágrimas parvas. Temos tantas coisas em atraso. Eu gosto tanto delas.
Ficávamos as três num quarto, a conversar até de madrugada. Desde os trabalhos de grupo que não partilhamos madrugadas. Lembro-me em particular de um, em 1993, para o "Sr. Rui", o assistente puto que agora é meu marido. Tivemos 19/20. Era tudo tão fácil.
Na viagem, podíamos tomar pequenos-almoços compridos, preguiçosos. Claro que teríamos que arrastar a A. da cama e a P. arrancaria nódoas da manteiga. O meu prato ficaria cheio de côdeas de torrada. Na Císter havia quem só viesse para o pequeno-almoço. Aprendíamos tanto como nas aulas.
Durante anos a PT ganhou fortunas com a nossa triangulação de números. Os pais nunca perceberam como é que havia sempre tanto assunto, tantas dúvidas para tirar, as matérias desfiadas em horas de queixas e comparações. A Ana ia sempre à frente nos apontamentos. A culpa era das canetas. Ela usava sempre a Parker de tinta permanente e eu tinha que ensaiar novas combinações de papéis e cores para cada etapa. Fizemos dezenas de exames lado-a-lado porque éramos seguidas na pauta e na vidinha.
Na viagem escolhíamos uma fila de três.

19.6.06

Yellow submarine

Hoje tenho um dia infinito.
Emoldurei a visão de umas calças de ganga com bordados amarelos nos bolsos para me distrair. Espreitei-as a correr, sem querer, antes de um comboio. Tinham um corte estranho e provavelmente desergonómico, mas flutuam redentoras na minha imaginação e isso é que é preciso.
A minha linda filha e as suas tiradas de pespineta não funcionam como alívio porque me ocorre logo o recado e a falta das calças de treino não sei de que cor para a festa da escola.
O meu marido hoje saiu de gravata, vai vestir beca e dizer consequências numa sala de provas que recentemente foi preciso desinfestar por causa das picadas dos bichos.
Tudo o mais são pardais.
Submerjo.

18.6.06

How the Leopard Changed Its Spots

Ontem de manhã experimentei duas vezes uma blusa com padrão de leopardo. Sob o olhar divertido da minha filha, transformei-me numa Xena de centro comercial. Só não trouxe aqueles 14,99€ de tolice por cobardia. Apeteceu-me tanto o toque vulgar. Desejei-o com a maturidade de quem há uns anos acharia uma tal camuflagem inconcebível. Há coisas que é preciso crescer para usar: leopardo, unhas vermelhas, brilhantes, pérolas, saltos, malas de mão. São coisas de mulher que as miúdas desdenham ou imitam sem convicção. São coisas que já abominei e agora visito. Com parcimónia, mas muito desejo.
Suponho que ainda pareça uma miúda. Tratam-me muitas vezes por "menina". Passeio casualidade pelos corredores onde passeei juventude e inconsequência, mas todos sabemos que já não é a mesma coisa. Os alunos de licenciatura parecem-me tão novos, tenros, desavisados. Lembro-me de sermos assim e não percebermos. Lembro-me de nos acharmos crescidos, decisores, decisivos. De achar o leopardo uma coisa hedionda. Eu ainda acho o leopardo hediondo, mas apetece-me na mesma, embora talvez preferisse a zebra. Isso e umas unhas de sangue.

P.S. Não, não foi o pai que pediu a lingerie da loura. Foi a miúda.

14.6.06

Quem disse isto?

Quero umas cuecas da Barbie.

1. Ana Maria, 33 anos.
2. Mariana, 2 anos e meio.
3. Nenhuma das anteriores.

11.6.06

Sugar white

Quando ela falou no Chefe Silva, sorri-me toda por dentro.
Quando sai da casa dos meus pais levei alguns dos volumes encadernados da teleculinária. Durante os primeiros meses/anos desfolhei gostos e aprendi a proporcionar ingredientes. Aos maravilhosos combinados do rectângulo nos anos 80, juntei umas libras de modernice. Cheguei a recortar dezenas de cantos de revista. Agora confesso que raramente receito. Concordo com o Jamie* no rigor de escala que requerem alguns bolos, mas eu também não gosto de fazer bolos. Mexo bem os doces, mas não gosto de depender de leveduras e cozo sempre demais.
Lembro-me dos assados com castanhas, dos volumes especiais da Páscoa, dos pastéis de nata e das bolas de berlim e, claro, do bolo de noiva. Cheio de desenhos de açúcar num fondant branco, muito branco. Muitos anos depois explicaram-me que havia truques nas fotografias, coisas imundas de publicitário, como o creme de barbear/chantilly. Não acredito.
O meu bolo de noiva não tinha andares. Era um círculo térreo de massapão, rodeado por uma coroa de folhas de hera, mas o meu vestido era branco como o fondant. Descontando as primas nubentes de outras décadas, ninguém mais escolheu o branco. Arrozei uma paleta impressionável de bejes, mas nenhum branco. O tule branco é tão mais bonito. Aposto que o Chefe Silva concordaria comigo.

*Há bocado embeicei-me outra vez. Até me apeteceu fazer bolo de banana, eu que não gosto de coisas de banana. Bolo de banana é tão, tão brit. Com icing, claro.

9.6.06

Mi potty es tu potty

Ontem tive um bocadinho de amiguinha, o que já não acontece muitas vezes.
Tenho amigos fantásticos, mas quase nunca estou com eles. Porque vivem noutros países, noutras cidades, noutros bairros e, essencialmente, noutras vidas. A gente cresce e deixa de ter uma vida comum com os amigos e arranja uma vidinha própria.
A minha amiga de ontem é daquelas que não vejo durante meses, cujo dia-a-dia não acompanho, mas que percebe sempre o que quero dizer. E isto, isto é uma preciosidade.
A maior parte das pessoas não percebe o que que eu quero dizer, porque:
- eu não lhes digo nada, ou
- não ouvem o que eu digo, ou
- ouvem e acham que eu sou um bocado parva, ou
- são um bocado parvas, ou
e isto é terrível, não percebem quando falo a sério ou a brincar.

A L. percebe tudo, eu só não lhe digo mais porque não dá tempo e somos as duas um bocado parvas.
Trocámos novidades e antiguidades, teorias da vida e retratos da britlândia. Descansei porque a Gap anda sem graça, mas fico para aqui a remoer a Muji. Para provar que somos mesmo todos amigos, a Mariana partilhou, uma vez mais, os seus by products numa potty session social enquanto regávamos a lasanha com sangria branca. Cheers mate.

7.6.06

Ainda da colecção "O corpo humano"

Hoje de manhã, enquanto esprávamos que descesse o xixi, disse-me que "a Miana não tem pilinha".
Quando os meninos começarem a fazer xixi de pé, cheira-me que ma vai pedir. É assim a única coisa para que me ocorre vantagem.

6.6.06

Escatologia

A minha filha cheira muito mal dos pés.
Desde bebé.
Era mínima e já transpirava as meias. O que é cómico. Aquelas meinhas muito pequeninas, muito simbólicas, muito girinhas e muito mal cheirosinhas.
Desde bebé que temos a brincadeira do Pffff. Eu tiro as meias, beijo os pés e franzo um Pffff. Ela ri-se muito.
Há dias em que a minha filha vem da escola imunda. Com as unhas sujas e a cara riscada de pó.
Às vezes também tem mau-hálito. O pai chama-lhe bafo de morcego. Eu até já me queixei ao médico se seria dos adenóides. O médico disse-me que achava que ela sobreviveria.
Os cocós no bacio então são nauseabundos. É que ainda estamos na fase de apreciar o momento e encorajar a publicitação dos despojos. Eu acho graça quando tem sementinhas de kiwi.

Mari(ana) go round

A nossa terra está em festa e ontem descemos ao recinto. Alimentei a minha filha a pão com chouriço e farturas e andou sozinha no carrossel dos pequeninos. Por um lado eu estava desejosa que aquilo parasse, como acho que vai haver alturas em que vou desejar que lhe pare o crescimento.
A dada altura, feliz, abanou as ancas desfraldadas com o ritmo da feira e eu quis parar o tempo, como na história da bela adormecida, para lhe apreciar o gingar, o (des)penteado, a farinha do sorriso.
Agora, agorinha mesmo, está a sair para o primeiro passeio da escola. Agarro-lhe a mão recortada, pintada de azul, que tenho em cima da secretária. Viro-a e leio: mil beijinhos para ti mãe .
A Mariana anda numa fase de exploração e descoberta. Ontem queixou-se que tinha uma borbulha e apontou, desgostosa, para a maminha.
Hoje anunciou que tinha piolhos* nos braços, como o pai.

*pêlos

Decreto-Lei n.º 156/2005, de 15 de Setembro

Este estabelecimento está em declarado incumprimento porque não tem livro de reclamações.
Registaram-se oficiosamente várias queixas pela quebra de assiduidade.
Pedimos desculpa pelo incómodo.

29.5.06

Stamina

(Post em draft há mais de uma semana)

Aquilo que eu mais gostava na televisão brit era os house-makeover e os programas de culinária. Não deixa de ser curioso que uma das nações mais pirosas e mal alimentadas do primeiro mundo devote tanta antena aos seus pontos fracos.
Ontem, antes de almoço, enquanto não chegavam os motores do Mónaco, vimos o Jamie a fazer uma paella.
Paella é uma óptima comida de festa. Eu já fiz na wok e pode-se usar o que houver à mão. O Jamie é ultradespachado e credível. Comentei o charme que tem um homem que cozinha, mas quem hoje de manhã rejubilou com o facto de já ter o jantar de logo adiantado fui eu.
O Jamie usou açafrão em rama, que é como quem diz os órgãos reprodutivos femininos da flor de Crocus sativus. Parece que é a especiaria mais cara do mundo.
O Jamie explicava isto quando perguntou a um amigo (zoólogo?!) quantos "estames" tinha cada flor, já que ele era um especialista (?!). Ou melhor, a tradução pt foi estames, mas ele falava era de estigmas. Na verdade, a flor do açafrão tem três estigmas. Tenho que comprar um livro do Jamie, trazer a wok para cima e deixar-me de trivialidades botânicas.

Esplendoroso

Eu não sou uma miúda BD, mas tenho pena.

Ordinary life is pretty complex stuff

28.5.06

Thirtysomething

Dou-me mal com o calor. Gosto do quentinho, mas não das brasas. Nunca seria uma gata borralheira.
A minha Mariana fez ontem dois anos e meio, 30 meses de menina. Fomos à praia de manhã. Gostamos todos da praia. Hoje fomos ao parque. De resto arrastamos o calor numa agenda preguiçosa de puzzles, legos e bocados de histórias de dinossauros em brasileiro. No meu tempo os filmes eram todos dobrados em brasileiro, mas agora a coisa soa tão estranha.
Lembro-me bem da Brânca di Néve e os Séti Anões. O meu primeiro cinema, a primeira história dela em modo repeat. Foi uma coincidência. Incidimos as duas numa maçã vermelha e um espelho mágico. Não há menina mais linda do que a minha.
Conseguimos finalmente apanhar o filme. Enranhosei-me das vergonhas do mundo, do meu mundo. Eu já estive em Londres, mas nunca fui a África. Acho que nunca irei a África e voltarei sempre a Londres. Culpo o calor. Culpo-me do calor.

24.5.06

Do you care?

I couldn't care more.
Parabéns amiga.

23.5.06

Ask me if I care

Ontem dormiu sem fralda pela primeira vez. Acordou de noite e chamou-me, um bocadinho aflita. Molhou os sonhos com as primeiras gotas e aguentou o resto como os crescidos. Hoje nem acordou. Seca.
Isto não interessa nada a ninguém senão a mim, but
this i my party and
I cry if i want to, cry if i want to,
You would cry too if it happened to you
.

Também já me apeteceu mais escrever do que agora.
Também já me apeteceu guardar a vidinha noutro sítio; na cabeça, por exemplo.
Porque ao fim de um tempo tudo se torna demasiado, demasiado sério, fundeado, performático.
Técnica. Há uma técnica e é isso que eu ensino. Eu antes sabia outras coisas. Mais selectas, sérias, consideradas. Coisas que agora ensino a contar com leveza, ritmo, estrutura. Agora não tenho nada para contar, vivo de contos alheios. Já não trabalho em transdução de sinal. Adoro a palavra transdução. Não é uma gralha, é uma palavra bonita. Não é nada como tradução. Cairam-me letras do trabalho...tralho.
Técnica, é tudo uma questão de técnica.

21.5.06

Os despojos do dia

Combinámos no anfiteatro de pedra.
Vimos os patinhos, procurámos as tartarugas, ensaiámos xixis na relva (um terço de nós).
Corremos à vez atrás dela.
Depois das combinações alternativas no buffet do CAM (o que eu gosto de mousse de abacate!) recuperámos o interior do sistema excretor da minha filha, perdido pelo chão da casa de banho com a aflição de quem ainda não controla os esfíncteres. Há coisas que só se partilham com os amigos.
Obrigada Pat.

Happy ever after

Era uma vez uma rainha...
E chega o pínxepe!
Um dia o espelho mágico diz-lhe...
E chega o pínxepe!
A menina trinca a maçã....
E chega o pínxepe!

Quase dois anos e meio, 12,650 kg, 89,5 cm e já está à espera do príncipe.
Maldito cromossoma.

15.5.06

Atrix/zes

A história da bruxa, quer sempre a história da bruxa. Que é a história da Branca de Neve, assim mais ou menos. A história da bruxa tem argumento variável, conforme a disponibilidade. Hoje de manhã, antes de eu me transformar mesmo numa bruxa atrasada e esganiçada, ensaiámos o riso da bruxa e o desmaio da Branca de Neve quando come a maçã. É a vantagem de contar a história em cima da cama. A Branca de Neve pode desmaiar em conforto.

No sábado vesti uma saia de ganga. Por sinal nova e por sinal demasiado parecida com outra saia de ganga. Na entrada do jardim, bate-me na perna e diz a sorrir, compincha, "Ai, saia nova, hem?" Quase que esperei ouvir a seguir, "espero que tenha bolsos, para esconder essas mãos".

Perguntei-lhe se queria ser a princesa ou a bruxa. Escolheu...

13.5.06

XL

Ontem fui ao Porto, assim de repente. Ou melhor, assim em pouco mais de três horas. Uma canseira institucional que valeu a pena, valha-me isso. Na volta (achei que não voltava, entupida que fiquei no pó do trânsito) encontrei uma antiga colega, mãe de gémeos mais um. Desentalei-me dos três francófonos que partilhavam a minha ilha e falámos dos miúdos e da redacção. Não me pude queixar muito que ela ganhava-me qualquer inconveniência. A multiplicidade esmaga-me.
Comi umas sandes emborrachadas. Dói-me o ombro do (im)portátil. Ainda bem que fui que foram outros que também importam. Só é pena o Porto ser lá tão longe e tão apertadinho e com tantas obras. Tenho saudades de ir ao Porto e passear. Eu gosto do Porto, mas há que tempos que lá não vivo nada que não canseiras. Apeteceu-me comer éclairs e andar na rua. Andar de táxi no Porto é uma chatice e não se ouve os locais a falar. Pedi um mil-folhas que lá tem outro nome. Trouxeram-me uma coisa que lá se chama mil-folhas, mas que não tem nem 250 folhas. Viam logo que vinha de Lisbôa. Estivesse lá eu uma semana e iam a ber se me apanhabam.

10.5.06

XS

A top model hoje levou um colar de cores.
Antes de sair, garantiu-se com o espelho, Espelho, espelho meu, há alguém mais bonita do que eu?
Eu saio de casa cega de mim e do estado do meu cabelo, mas a minha filha não.

As minhas amigas têm blogs mesmo giros.

Delfina

A conversa começou no banho. Muitas conversas começam no banho. Como aquela em que eu era uma bruxa feia. Tu és uma bruxa feia. Está bem. Sorri-me com o atrevimento, com o ladear do olhar, cauteloso depois do insulto. Acho muito fixe ser uma bruxa feia. As fadas lindas são umas chatas e aposto que vestem Gant ou Sacoor. Nós, as bruxas, não precisamos de ter caracóis, e se há coisa que eu gostava era de não ter caracóis.
És uma baleia, digo-lhe eu enquanto a esponjo de ternura. Não, a Miana não é baleia, é golfinho. Ah! Ela disse mesmo isto?
És golfinho? E a mamã?
A mamã é baleia!
E começámos a catalogar as pessoas da vidinha. Todos baleias menos o amigo Tiago e a educadora Lúcia, que são golfinhos. Estou a ver, o poder da escola. Hoje não como folhados.

6.5.06

butter fly


Sim, somos nós as duas.

Jacintos

Hoje cruzei-me com a tutela nos livros usados do Chiado. Reconheci foi a voz, que eu estava semicerrada de calor. Tinha umas coisas para lhe dizer, mas não me apeteceu gerir o acaso com tanto sol. Aposto que quando for velhinho vai fazer listas em folhinhas de bloco, com minúcia e fato completo, como o senhor que ocupava o canto em frente da minha tarte de chocolate. Papelinhos escritos com cuidado e analisados mil vezes com a dignidade de quem ainda usa colete. Apeteceu-me apresentá-lo (o velhinho, não a tutela) ao volume cor-de-rosa que levou as sandálias-bota de cabedal preto. Um rendilhado extraordinário que passava o joelho e a postura, já de si comprometida com o batôn rebuçado. Eu chequei uns trainers desmarcados por 24,95 e aquele poço de confiança britânica ensacou umas férias de luxúria inolvidável. Shame on me.
O que eu gosto do Chiado.
No outro dia cruzei-me com o Jacinto, um exemplar perfeito do rapaz que sempre me despertou, assim rasteiro e de camisola cinzenta, uma mistura de FCUL e FCSH de meados de 90. Tive poucos namorados, todos muito diferentes, mas nenhum seria homem para usar uma camisa cor-de-rosa, por exemplo. Há uns anos consegui convencer o meu marido que mostrar os dedos dos pés não é gay. Que as sandálias são uma necessidade de país quente. E acredito que, ainda hoje, o G. prefira arder a destapar a base.
Nunca dei a mão a umas alças, cavas ou justezas de tronco, os óculos são para proteger os olhos e não para estilizar o rosto, as malas seguram-se com a mão ou mochilam-se. Ainda bem que eu tenho uma filha.
Aposto que o Jacinto fala baixo. O meu marido fala tão baixo que já sujei a roupa a debruçar-me sobre a mesa. Estou treinadíssima no tirar umas por outras. Sabe Deus os equívocos que coleccionei estes anos todos.
Pat, quase que me esquecia de te contar que ontem esbarrei naquele lá da FCUL, acho que lhe chamava Francisco, como sempre. Lembras-te? Aquele da Física, do C1, com quem nunca falei. Está um bocado gordo e um bocado careca. De resto igual. Apeteceu-me pará-lo e dizer-lhe olá, com 15 anos de atraso. Que disparate.

Quitação

Ontem apercebi-me que perdi de vez o ar desvalido.
Durante anos reuni comentários, mais ou menos repetitivos, e olhares enrugados de ternura e desaprovação da ascendência. Lá me safava nas efemérides, mas o quotidiano desvalia-se numa patine descolorada da maioridade que atestavam os certificados. Como tão bem disse um dia o meu pai, só tenho jeito para profissões de mal vestidos. Confirmo-o com o orgulho que ontem perdi na estação de comboios de Aveiro. Já não sou uma desvalida, uma descamisada. E quem não o percebe, não percebe nada.
A aula correu bem, bem demais. Assustou-me a fluência quase política, as graças reditas como se fossem inéditas, o controlo quase aéreo do tempo, dos tempos. Só não fico mesmo preocupada porque transpirei. Quando um dia fizer isto sem destilar um picolitro de ansiedade é porque a aula morreu.
Trataram-me por professora muitas vezes e voltei a achar que no norte há demasiados professores. A malta cá mais para baixo caga nisso. O campus é fantástico e estava sol. Volto em Junho e espero que nessa altura alguém já tenha explicado à CP que não há paciência para ver a Marisa Cruz a fazer massagens durante a viagem.
A preocupaçao com os documentos de quitação fez com que fosse em primeira. Não comprei no MB e o comboio esgotou. Ontem houve uma multidão de tugas que viram a Marisa Cruz a ser massajada para cima e para baixo, enquanto eu percebia que estava definitivamente uma senhora.

3.5.06

Malaise de vivre

Ironicamente, redescobri a expressão este fim-de-semana, por causa do Freud e tal. Que estava em todos os jornais e afins. Este fim-de-semana li mais jornais do que no resto do ano e tive-a a martelar na cabeça, à malaise. Assim do lado de fora da cabeça, que eu não sou ingrata e este fim-de-semana foi óptimo.
Malaise é uma palavra linda. Só é pena ser uma coisa má, mas isto acontece-me frequentemente com o francês. As palavras são lindas, mas têm mau fundo, como malheureusement, a mais falsa de todas.
Se calhar aquilo que eu, e a esmagadora maioria das minhas amigas, temos é uma forma de malaise de vivre, uma nostalgia trintona de nós próprias e das nossas expectativas.
Contaram-me duma mãe que teve que fazer uma cura de sono, porque o filho não dormiu até aos 3 anos. Todos me prometem agruras incomparáveis a ranhos, tosses, galos ou varicelas. Ainda ontem a Juíza Amy se estrapalhantou com a filha adolescente na Sic Mulher. Parece que com os adolescentes é que é a doer. Eu, que já me zango porque ela não me deixa vesti-la sem pinotes, tenho que repensar a minha escala de gravidade e gritaria. Ela foge-me, encaracola-se, mede-me, repete uns nãos trocistas, amolece os membros e ensaia um choramingo. Eu enfio, puxo, afino manobras de placagem e, invariavelmente, grito. Uma doida, uma mamã muito doida, se isto lá tem alguma importância.
Mas oiço as miúdas todas atrapalhadas e a culpa é da malaise.

Bonheur de vivre


27.4.06

Hoje calcei finalmente as sandálias. O mundo parece-me ligeiramente torto e eu devo parecer torta ao mundo. Praguejei várias vezes antes de sair de casa. Ai, que mau feitio. Mas, das várias coisas que me aborrecem, uma delas é demorar para sair de casa. Claro que a miúda quis fazer xixi no último minuto. Claro que chegou mesmo a ameaçar um cocó. Claro que subo vezes sem conta para resgatar mais qualquer coisa, para espirrar o perfume ou pincelar as bochechas, para procurar a chucha, para desligar a internet, para o caraças. Saio sempre desabada, semi perfumada e semi corada. Às vezes esqueço-me de me pentear. Os colares e as pulseiras vão na mala e às vezes não saem de lá. Ela hoje pediu-me a pulseira emprestada. Achei tão giro. Pediu para a mãe empestá a pulseira. É tão gira, a pulseira. E a miúda. Adoro-a, parece que tem bombons enfiados. A pulseira.
Hoje fazemos 100 meses de maridinhos e ela 29 meses de miúda. Endireito-me.

25.4.06