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27.1.06

Capoeira

Hoje sonhei com uma amiga que já não vejo há uns dois anos, mas sei que não consegue engravidar. Há duas semanas escorreu-lhe uma FIV e comparámos inundações. Recordei dores e procedimentos. Já quase esqueci a angústia.

Doidas, doidas, doidas andam as galinhas

Quase toda a gente tem filhos, parece-nos. Como a miúda de 16 anos, uma bola redonda, redonda, no corpinho apertado; o cabelo liso, infantil, as pulseiras de prata, o ex-namorado; descuidou o sábado e agora estava ali ao meu lado, que ecografava uma barriga derrotada, tumular.

Para por o ovo lá no buraquinho

Fomos ao casamento deles. É um casal muito bonito, saudável. Quando éramos miúdas enfrentei-lhe nem sei quantos pretendentes. Os olhos azuis, rasos. Porque quem ainda não tem não sabe se vai ter, porque parece que toda a gente tem menos nós, que queremos tanto.

Raspam, raspam, raspam, para alisar a terra

É como os jogos de vídeo, cheio de níveis. Eu passava logo o primeiro, mas aterrava no segundo. Há quem não consiga começar a jogar. O contador a passar e os jogadores imóveis. O árbitro a mandar seguir, a não registar faltas, e o esférico parado.

Bicam, bicam, bicam para fazer o ninho

Outros amigos chegaram a mudar de casa, de carro, para uma vidinha que não chegou, que entretanto se dividiu em duas. Porque parece mesmo que toda a gente tem. Como quem entrou comigo naquela tarde, com 31 semanas de enfado e que no dia seguinte passeava os cigarros no corredor, que só lhe vi sempre os cigarros e o enfa(r)do. Quem não tem não sabe se vai ter e isso é uma grande aflição. Escorrem-se sonhos e expectativas.
De manhã acordou cedo e pediu-me o leitinho. Agarrei-a quentinha, agarrei-a tanto. Atrasámo-nos mais um bocadinho com toques de mimo, deitadas, amigas, 26 meses de juntas.
A ver se ligo à Rita.